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CERRADO INFINITO das nascentes do
água preta ( praça da nascente )

Início: Desde 13 de junho de 2015.

Local: Praça Homero Silva, ( Praça da Nascente ) Sumarezinho, ZO, cidade de São Paulo.

DEFINIção conceitual: Ecossistema cultural ruderal ou território vegetal descolonizante

Área aproximada: 2000m

Trilha: 400m

Espécies EM DESTAQUE: Capim-rabo-de-burro, capim-barba-de-bode, lobeira, araçá-do-campo, guabiroba, fedegoso, carqueja, alecrim-do-campo, capim-sapé, capim-colchão, capim-pé-de-galinha, língua-de-tucano, elegante, erva-grossa, jurubeba, candeia, juqueri, arranha-gato, dormideira, barbasco, branqueja, begônia-do-brejo, fruta-do-pombo, copaíba, sumaré, batata-de perdiz, canela-de-velho, marmelinho-do-campo, amargoso, arnica-do-campo, caraguatá, murici, ananás...

Ações: Plantio e manutenção do Cerrado Infinito aos sábados das 9h as 11hs.

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O Cerrado Infinito da Praça da Nascente foi criado coletivamente por um grupo flutuante de pessoas, mais ou menos organizado, que atuou durante cinco anos. Dentre as várias pessoas que participaram, destacan-se  as contribuições fundamentais do programador Evandro Saroka, do fotógrafo Tiago Queiroz, da arquiteta Mariana Prata, do engenheiro florestal Paolo Sartorelli, das artistas visuais Letícia Rita, Thiago Ruiz, Mônica Rizolli e Lucilene Lamano, da dançarina Anna Luiza Marques, da bióloga Bianca Brasil da curadora de arte Ananda Carvalho, do somelier Elvis Rocha e da designer Erica Bettiol. Nesse período, estabeleceu-se a trilha e com ela a área de ocupação das plantas na praça — formando a primeira paisagem de cerrado recriada em um ambiente urbano.

No contexto da Praça Homero Silva — popularmente rebatizada como Praça da Nascente por abrigar oito nascentes, além de outras nos arredores que juntas formavam o córrego do Água Preta — o Cerrado Infinito é um trabalho de anti-paisagismo: não segue um projeto ou desenho específico, desenvolvendo-se apenas a partir de uma diretriz básica — plantar nas margens da trilha e fazê-la expandir ao máximo.

A trilha serpenteia em zigue-zague, sem intenção de transporte ou finalidade prática; ao contrário, ela constitui um trecho físico de um percurso mental infinito, com o desejo de que o passeio imersivo entre a vegetação se prolongue indefinidamente, permitindo o convívio e a sensibilização com as plantas — e, por consequência, promovendo uma descolonização que começa na percepção da vegetação local e se desdobra em transformações mentais mais amplas.

O território, constantemente ativado por visitantes e colaboradores, tornou-se rapidamente uma espécie de ateliê aberto e palco de experimentações que culminaram nas dez edições do evento Descolonization!!! Piquenique Internacional de Descolonização da Paisagem Vegetal Mundial.

A cada edição, o Cerrado Infinito se afirmou como um ecossistema cultural ruderal, com apresentações de performance, dança contemporânea, instalações, arte sonora, oficinas, palestras e outras experiências vivas.

No entanto depois de aproximadamente cinco anos, o grupo mais atuante, se dissolveu completamente com a chegada da pandemia de Covid-19.

Durante o período instável e restrito da pandemia, impossibilitado de agrupar pessoas,  o Cerrado Infinito foi mantido e ampliado pelo idealizador Daniel Caballero, com ajuda dos artistas Letícia Rita e Thiago Santinho, além de outros poucos participantes esporádicos, e uma equipe de três jardineiros contratados: Tanga, Seu João e Clodoaldo. Pontualmente, contou com o apoio fundamental da Subprefeitura da Lapa, que disponibilizou suas equipes para realizar podas em árvores, manter e desenvolver a trilha em condições de visitação, além de cuidar da Praça da Nascente como um todo, sob nossa supervisão.

Nesse período, em contraste, ele se fortaleceu com a baixa circulação de pessoas; a vegetação se adensou e tornou-se mais resiliente, chegando a dobrar sua trilha e área, eliminando gradualmente os capins exóticos da praça.

No entanto, esse avanço territorial não consolidou novas áreas de cerrado, e aos poucos os capins exóticos tem retomado seu lugar.

Do período pós-pandêmico até o atual, ele tem sido mantido pela equipe dos três jardineiros citados, pagos com a venda de camisetas de plantas do Guia de campo do Cerrado Infinito, sob a supervisão de Daniel Caballero, além de eventuais plantios abertos á colaboração. 

Sua manutenção é feita muito mais pela eliminação de plantas exóticas, onde as pessoas atuam como animais pastadores, principalmente de capins africanos, além de remoção de lixo. Por outro lado, as plantas do cerrado sofrem com atos de vandalismo, e roubo de plantas, que são assimilados como parte da sua ecologia. Provavelmente ao longo do tempo muitas das espécies que compõem sua biodiversidade vão desaparecer, e apenas vão se manter as que conseguirem se reproduzir e enfrentar as fricções urbanas  com a população.

A obra, propõe um desprendimento do cidadão em relação ao território urbano, onde ele existe, estabelece-se um território vegetal soberano, voltado à continuidade das plantas nativas campestres, sem qualquer finalidade utilitária.

Nesse espaço, acompanhamos seu desenvolvimento reduzindo progressivamente nossa atuação, para que a dinâmica das próprias plantas guie o processo. Pode-se pensá-lo como uma célula de vegetação campestre: matrizes se reproduzem, novas plantas se instalam onde querem, sem controle, e, com a ajuda da avifauna, arriscam dispersar-se para além dos limites da praça.

Essa vegetação resiliente, se é para ter alguma utilidade, é talvez a melhor estratégia de renaturalização da cidade de São Paulo — uma cidade que carece de áreas verdes densas, autossuficientes, capazes de ativar a biologia local.

Definitivamente, o Cerrado Infinito não é um jardim no sentido clássico — não guarda compromisso com uma estética inventada. Sua beleza está no acompanhamento de seu desenvolvimento natural. Também não é um pomar: não há qualquer intenção agrícola ou medicinal em sua formação.

O sentido proposto está na experiência de caminhar por sua trilha, vivenciar um deslocamento em relação ao ambiente urbano, exercitar a sensibilização diante dessa vegetação e promover uma descompressão da tensão cotidiana da cidade.

Se pudermos usar o termo "medicinal", o Cerrado Infinito atua nesse plano simbólico: propõe uma mudança cultural e descolonizante em relação à origem da cidade, sua história de violência ambiental e racial, entre tantos outros problemas — apontando, assim, caminhos possíveis de cura.

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